Artigo de Yonason Goldson, originalmente publicado no jornal Jewish World Review.
O autor mostra o lado involuntariamente cômico de se ser criminoso, e indica algumas respostas a perguntas que todos, inevitavelmente, nos fazemos. Sua linha de raciocínio lembra o conto de Machado de Assis, A Igreja do Diabo, que você pode ler aqui. (Caso não tenha lido ainda, LEIA. Machado de Assis é sempre obrigatório).
O que os cibercriminosos podem ensinar aos que estão dentro da lei sobre a terra ética de ninguém
“O cibercrime está fora de controle.”
Assim diz Caleb Barlow, vice-presidente da IBM Security. Se você já está preocupado com a fraude doe cartão de crédito e o hacking russo, talvez você não queira continuar lendo.
Por outro lado, há uma lição para todos nós do mundo da vilania virtual.
A maioria de nós aceita a espionagem na Internet, phishing de e-mails, e vigaristas como parte da vida, o equivalente virtual de propinas políticas, assaltos e tiroteios. Nós não gostamos deles; mas o mundo real não é um mundo perfeito, então aprendemos a aceitar o mau com o bem.
Mas o que está acontecendo no submundo da internet é uma realidade diferente. De acordo com as Nações Unidas, 80% do cibercrime é perpetrado por sindicatos altamente organizados e super-sofisticados, representando uma economia de 445 bilhões de dólares em lucros ilegais, maior do que o PIB da Irlanda, Finlândia ou Portugal.
Em um recente Ted Talk, Caleb Barlow apresentou um relato terrível e surreal de organizações criminosas que operam como empresas profissionais e legítimas, com serviços de assistência em inglês e sites falsos de bancos. Elas operam anonimamente na Dark Web, que a maioria de nós identifica como algo de um thriller de Kiefer Sutherland.
Mas é real. Tão real, de fato, que se você tropeçar em um dark site, você acharia que está fazendo compras na Amazon ou verificando comentários na Angie’s List. Esses sites secretos oferecem pacotes de hacking bronze, prata e platina, preços competitivos, referências e revisões, classificações estreladas e garantias de devolução do dinheiro de que você ficará satisfeito com o ataque cibernético que você compra.
– Claro – diz Barlow – se você vai comprar um ataque, vai comprar de um criminoso respeitável com boas classificações, certo?
A FRAUDEe PERMANECE A MESMA
Lembro-me de um fenômeno desconcertante do meu passado como professor de ensino médio. Ocasionalmente, eu tinha alunos que faziam mais esforço trapaceando do que eles precisariam fazer para realmente aprender o conteúdo. Mesmo depois de serem pegos uma vez, eles ainda tentavam novamente na próxima vez.vez seguinte
Pode ser que algumas pessoas estejam programadas para ser desonestas. Mas há outra explicação mais preocupante.
O que é realmente bizarro é o quanto os próprios criminosos são similares aos empresários “normais”. Eles trabalham em horários regulares, de segunda a sexta-feira. Eles apelam contra críticas desfavoráveis e educadamente argumentam contra comentários pouco favoráveis. Eles empregam a linguagem legalista de acordos de licenciamento, mesmo que comercializem passaportes e carteiras de identidade falsas.
Em outras palavras, eles estão fazendo tudo o que estariam fazendo se estivessem executando operações legítimas. E, presumivelmente, eles têm a perspicácia de negócios o suficiente de que poderiam estar levando uma vida agradável sem violar a lei.
Então por que eles não se legalizam? Pela mesma razão, talvez, que os homens casados com mulheres atraentes enganam suas esposas e multi-milionários se engajam em especulação.
DOIS AÇÚCARES, POR FAVOR
O Talmud observa que as águas roubadas têm um sabor mais doce.
Como seres humanos, estamos perpetuamente em guerra contra nós mesmos. De uma parte de nossa psique, nós nos visualizamos como pessoas boas, cidadãos honrados e membros virtuosos da sociedade, que contribuem para o bem comum e para o bem-estar geral.
Mas, de um ponto mais obscuro de nossa natureza, nós nos identificamos com o lobo solitário, o dissidente, o renegado que rejeita as normas sociais e ataca por conta própria, pegando o que quiser e desrespeitando as convenções da comunidade em geral. A auto-validação que resulta de ultrapassar limites, a emoção de desafiar fronteiras, a liberação de endorfina que provém de arriscar as consequências da má conduta – estas são as recompensas psicológicas e fisiológicas do crime.
Antigamente, entendia-se que a maioria dos crimes nascia do desespero. A maioria dos exilados da Botany Bay foi levada ao roubo pela necessidade de alimentar seus filhos. Com menor freqüencia, os crimes eram motivados pela oportunidade: uma bolsa deixada sem vigilância ou uma conta não controlada revelava o pior em indivíduos que, fora isso, eram honestos, que até podiam se arrepender de suas transgressões uma vez que o calor do momento tivesse diminuído.
A criminalidade fria e profissional de um Al Capone ou de um John Dillinger era uma curiosidade rara, embora terrível.
A FALTA DA FANTASIA
Mas há algo mais calculista a respeito da atividade da Dark Web moderna. Parece quase como se cybercrime deveria ter seu próprio quiosque em campi de faculdade na Semana da Profissão, oferecendo uma alternativa razoável a contabilidade ou enfermagem. A pessoa só tem que querer saber se o único ímpeto é dinheiro fácil, ou se ganhar a vida honestamente num dia de trabalho honesto parece aborrecido demais, mesmo que a rotina prática do dia-a-dia de administrar uma operação importante de roubo termine dando no mesmo.
Se assim for, poderíamos nos perguntar se alguma parte de nós não inveja esses cibercriminosos, não por sua falta de escrúpulos, mas por suas vidas de não conformismo e seu flerte com o desastre.
A televisão e os filmes podem estar desempenhando um papel de apoio. O aventureirismo romântico descrito por nossa indústria do entretenimento faz a vida normal parecer branda e vazia, na comparação. Não estamos perseguindo os maus, lutando pela liberdade, ou lutando com supervilões pel,o destino do universo; Então onde está o valor em nossas vidas?
Integridade, família e comunidade — tudo soa bastante maçante. Mas, e se resistíssemos à tentação de vender nossas almas por lucro fácil – ou, pior ainda, pelo zumbido da dopamina que poderíamos obter exploração criminosamente os outros? E se reconhecermos as recompensas mais sutis da moralidade e da ética consistentes, de construir a sociedade em vez de minar seus fundamentos? Então nos tornamos os verdadeiros heróis, alimentando nossos corações e mentes com uma dieta de virtude e auto-respeito, fazendo uma diferença positiva no mundo e preservando os valores que nos tornam plenamente humanos.
O rabino Yonason Goldson é um palestrante profissional e um instrutor. Ele ensina estratégias práticas para melhorar a comunicação, conduta ética e realização pessoal. Ele é o autor de Beleza Proverbial: Segredos para o Sucesso e Felicidade, da Sabedoria das Eras, que está disponível na Amazon.
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