A FCC [agência de comunicação do governo norte-americano] ainda define palavrões como linguagem que é tão “grosseiramente ofensiva” para “membros do público” que se torna um “incômodo”. O problema é quem define “grosseiramente ofensivo”, quem são os “membros do público” e o que qualifica como “incômodo”? As balizas em todos os três estão se movendo rapidamente e não em direção a definições tradicionais ou modestas.
Lembra quando se pediam contas das pessoas em posições de liderança e distinção, esperando que elas se comportassem com dignidade e classe? A GovPredict, uma empresa de análise política, rastreou uma tendência surpreendente, mas chocante, em relação a políticos e mídias sociais.[…] Segundo a empresa, os políticos vêm xingando e usando palavras que costumavam nos fazer corar, em comícios, em coletivas de imprensa, em debates e em suas redes sociais.
O resultado é que não é mais seguro assistir a uma entrevista com um líder eleito ou assistir a um debate na frente de crianças. Não podemos dar como certo que os locais públicos serão livres de palavrões. E a mídia reduziu drasticamente seus padrões. A CBS, a mesma rede que [em 1952] se recusou a transmitir a palavra “grávida”, recentemente apresentou um programa cujo título era um palavrão. As estações de rádio populares tocam regularmente músicas com palavras que há 10 ou 15 anos nunca teriam sido aprovadas pelos censores.
Por que isso é tão ruim? O que há de errado em xingar? Não reflete paixão, sentimento, emoção? Praguejar não é uma maneira saudável de encontrar alívio, de responder à dor ou à frustração? Não deveríamos acreditar que a pesquisa que diz que praguejar tem benefícios positivos ?
A resposta é não. Ceder ao desejo de usar um palavrão é perder nossa própria humanidade e satisfazer um impulso animal. Nossa sagrada Torá nos diz que a capacidade de falar, a arte da comunicação, é o que diferencia o homem do animal. Quando a elevamos, estamos agindo mais como Deus, e quando nos rebaixamos para usar vulgaridade ou obscenidade, estamos expressando a parte animal de nós mesmos.
Em “O que os palavrões revelam sobre nossa linguagem, nossos cérebros e nós mesmos”, o professor Benjamin K. Bergen compartilha a pesquisa por trás dos palavrões. Por exemplo, ele descreve como algumas vítimas de derrame ainda conseguem xingar fluentemente, mesmo que suas outras habilidades linguísticas estejam severamente prejudicadas. A linguagem avançada vem das partes mais sofisticadas do cérebro, enquanto os palavrões se conectam a um hardware neural muito mais primitivo nos gânglios basais.
Da mesma forma, a Síndrome de Tourette, que envolve disfunção dos gânglios basais, pode causar um desejo irresistível de xingar. A parte animal de nós quer amaldiçoar. Quando nos contemos, estamos expressando nossa própria humanidade.
[…] Quando expressamos autocontrole e disciplina, estamos imitando o Divino e, assim, exibimos dignidade e classe. Quando falhamos e cedemos a um desejo natural de xingar ou praguejar, é humilhante, estamos nos diminuindo.
Lutar contra esse desejo nem sempre é fácil, principalmente quando algo nos perturba, nos frustra ou nós nos machucamos fisicamente. Na era de hoje, pode ser particularmente difícil quando grande parte de nossa comunicação ocorre por meio de digitação[…], onde podemos nos permitir usar digitalmente palavras que não usaríamos verbalmente. No entanto, a capacidade de preservar uma linguagem digna, mesmo nesses momentos e nesses meios é, de certa forma, a própria medida de nossa humanidade e piedade.
[…] engajar-se em obscenidade, é tão severo, ainda mais do que outras formas de discurso negativo, como a fofoca, porque é usado mesmo quando ninguém está por perto; é articulado mesmo quando não há público para ouvir. Transigir quando não há benefício é, de fato, o mais degradante e, portanto, o mais grave.
Usar ou ouvir a vulgaridade é tirar um dom puro e belo, o poder da comunicação, e contaminá-lo e estragá-lo.
Sempre que ouço alguém xingar para tentar defender um ponto de vista, não posso deixar de pensar que, se eles fossem mais inteligentes, encontrariam uma maneira mais eficaz de comunicar esse ponto sem precisar se distrair com choque de usar uma obscenidade. Fico sempre menos impressionado, não mais, menos focado no que eles estão dizendo e mais focado no porque eles disseram dessa maneira. Fico menos convencido, não mais. Acima de tudo, fico desapontado por eles terem escolhido me transmitir sua contaminação, comprometer meu meio ambiente e prejudicar o clima que compartilhamos.
Seja online ou offline, as palavras que dizemos, e como as dizemos, refletem a essência de quem somos e de quem aspiramos ser. Se fizermos com que os “membros do nosso público” julguem toda obscenidade e vulgaridade um “incômodo” e “grosseiramente ofensivas”, podemos exigir um discurso limpo que não deixe emissões que impactem negativamente nosso meio ambiente para nossa geração e gerações vindouras. […]
O rabino Efrem Goldberg é o líder espiritual da Sinagoga de Boca Raton.