Epidemia grave de automutilações e suicídios em adolescentes (mídia e entidades médicas geralmente em silêncio). A sensação diária de “enxugar gelo” é insuportável na psiquiatria hospitalar de casos graves que eu faço. É mais insuportável ainda se você não trabalha por dinheiro ( o dinheiro poderia fazer você suportar mais); é mais insuportável ainda se você busca um pouco de resolutividade e realização profissional. Hoje em dia recebemos uma média de 3 pedidos por semana para internação de adolescentes suicidas ou automutiladoras. Por causa do tamanho muito pequeno de nosso serviço, temos de recusar quase todos. Não sei o que acontece, provavelmente estão povoando UTIs e Salas de Emergência. Não há psiquiatras (adequados) suficientes para atendê-las : exige psicoterapia, poucos psiquiatras querem fazer psicoterapia hoje em dia; psiquiatras são proibidos pela maioria dos planos de saúde – mesmo os ditos “bons” – de fazerem psicoterapia. O SUS e Planos de Saúde estimulam a psiquiatria superficial do “dar-pílulas-num-balcão-de-farmácia”. Psiquiatras , aqueles muitos para quem “a caneta é mais leve do que a conversa”, se acomodam na quantidade, em detrimento da qualidade. Famílias também não querem ser mobilizadas, por ex., não querem dar ocupação-responsabilidade para esses adolescentes, disciplina e castração (com amor e diálogo, evidentemente). Falta quase sempre a figura paterna (fisicamente ou psicologicamente); a ansiedade , quando não desemboca na depressão entediante suicida, desemboca para equivalentes de masoquismo sexual, a auto-mutilação (muitas são adolescentes sem vida sexual ativa, a auto-mutilação pode ser um equivalente de um masoquismo sexual mal-elaborado, inclusive por falta de um Édipo adequado, falta de uma paternidade adequada).
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Christee Parker. Foto de Matthew Poon /Credit: News Corp Australia.